quinta-feira, 13 de junho de 2013

Artigo da Laura Medioli minha linda amiga, escrito pra mim:

PUBLICADO EM 04/04/13 - 00h00 Conheci minha amiga quando ela ainda estava por baixo. Nosso primeiro encontro, que era para ser rápido, estendeu-se por toda a tarde, assim como nossos choros, angústias e medos. Depois, outros encontros e aquela sensação de impotência que nos bate perante uma força que desconhecemos. O poço das drogas é bem mais fundo do que imaginamos. Além das vítimas, desmorona a família, o trabalho, a dignidade... Faz com que se esvaia por um caminho muitas vezes sem retorno. Mas minha amiga conseguiu ser mais forte; na última vez em que estivemos juntas, foi para rir. Elogiei sua nova aparência, sua pele, seu cabelo e seu salto escandalosamente alto, mas, principalmente, o seu ótimo astral. A batalha, que parecia impossível, foi superada. Hoje, cedo meu espaço a um depoimento corajoso e sincero, escrito com a alma e com o coração por essa minha amiga vencedora. O crack e eu "O meu único inimigo: o crack, droga que, sem sombras de dúvidas, é mais perigosa do que todas as outras juntas. Estive com ela, fomos bem ao fundo do poço, eu vi a luz bem no fundo, mas ela não brilhava, era fosca, tinha uma palidez, um tom acinzentado, um gosto de dor, sei lá. De poder avassalador e sobrenatural, o crack sempre vicia quando do seu primeiro experimento, e o que vem depois é tragédia certa. Crack e desgraça são indissociáveis e quase palavras sinônimas. O crack é a verdadeira degradação humana; me transformou numa espécie de zumbi naquele tempo. Nada de banho, nada de amigos; somente a vontade de fumar e nada mais. Eu via naquela poderosa droga, mais barata e acessível, a pretensa solução para resolver ou para esquecer meus problemas. Na verdade, eu sempre pensei que a droga nunca me dominaria e que eu fosse forte, até ria quando as pessoas falavam que eu estava viciada. Na verdade, eu não acreditava. O fracasso da política antidrogas do governo é estampado nos quatro cantos do Brasil. A cada reportagem, nós assistimos, atônitos, a pessoas adultas, jovens, adolescentes e crianças consumindo o crack, deitados no chão das praças, nas calçadas, debaixo dos viadutos, das marquises, sem se incomodarem com nada ou mesmo correndo em desespero, vivendo naquele mundo imaginário, sem perspectiva de vida alguma. Me vejo em cada um deles. Meninos e meninas na flor da idade se prostituem até por R$ 1 e praticam qualquer ato ou todo tipo de crime possível em busca do crack. Famílias inteiras se desesperam vendo os seus entes queridos buscando o fundo do poço pelo crack, e eu sem poder fazer nada... me dói tanto! O crack traz a morte em vida, arruína a vida dos seus familiares e vai deixando rastros de lágrimas, sangue e crimes de toda espécie na sua trajetória maligna. A fumaça altamente tóxica do crack é rapidamente absorvida pela mucosa pulmonar, excitando o sistema nervoso, causando euforia e aumento de energia ao usuário. Disso, advém a diminuição do sono e do apetite, com consequente perda de peso bastante expressiva - cheguei a pesar 39 kg, quando pedi ajuda. Até hoje, sinto o cheiro do crack e um medo que me traz as lembranças daquela aceleração ou diminuição do ritmo cardíaco, uma transformação total da normalidade física. Ainda quase não durmo e faço uso de medicação para esse fim. Não é fácil, uma luta a cada dia. O crack me destruiu em vida, ao ponto de eu perder o contato com o mundo externo, me tornando uma espécie de zumbi, ou morta-viva, movida pela compulsão à droga, que é intensa e intermitente. A dificuldade que o dependente do crack tem ao querer deixar o seu consumo é imensa e requer uma força de vontade fora do comum, diferentemente do que acontece com os usuários das outras drogas. O crime organizado continua investindo pesado no tráfico de drogas. Muita cumplicidade perversa promove e mantém o crack no seio da nossa sociedade. Tudo prolifera e floresce com muito arranjo sinistro. A política de repressão ao tráfico não está sendo suficiente para conter o avanço do crack. A polícia, apesar de todos os esforços empreendidos, com prisões e apreensões diariamente de muitos traficantes e de grandes quantidades de crack, não é forte o bastante para vencer essa batalha. Aliada a tais medidas governamentais, é necessária também a conscientização popular, principalmente na área da educação. Entre as formas de prevenir está a questão de oferecer atividades escolares extracurriculares que despertem mais a atenção dos estudantes, além de um convívio mais profundo e dialogado de alunos com professores, psicólogos e especialistas, assim como entre pais e filhos, para, enfim, lutarmos com todas as forças possíveis contra essa epidemia. Não podemos achar que a polícia e a medicina resolverão os problemas, que, muitas vezes, se iniciam nos lares, nas escolas, nas festas, enfim, afetando principalmente os jovens, mais expostos, por vários motivos, à atração do mundo das drogas. Eu pedi ajuda, porém, meus pais não conseguiam acreditar nas pessoas; me viam drogada, mas nunca me ofereceram ajuda, apenas choravam. Eu gritei por socorro e, mesmo assim, quase não fui ouvida. Muitos não têm força mais nem para gritar. Perguntem se precisam de algo, se querem ajuda, conversem com aquela pessoa que você acha que está envolvida nesse mundo podre. Uma palavra, às vezes, faz a diferença. Eu, Carolina Fernandes Leite, hoje, sou livre do crack, mas presa a ele em cada pessoa que vejo sofrer".

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